Todos os Testemunhos da esperança
Todos os Testemunhos da esperança
MARIA ODETE DA COSTA: RAÍZES E RESISTÊNCIA
Maria Odete da Costa, a caçula de oito irmãos, cresceu em uma família marcada pela força e determinação. Filha de José Francisco e Georgina, Odete carrega em sua história a herança do pai, capataz da fazendo do “vô Zeca” (como eles chamavam) da família Costa. “Mas eu não sou Costa por causa deles, acredito temos esse nome por que meus ancestrais vieram da Costa do Marfim”. O pai, homem de respeito e confiança, cultivou valores de coragem e resiliência, refletidos na personalidade forte da filha. A mãe, católica, era Filha de Maria, cresceu dentro do Colégio Santa Rosa.
A infância de Odete foi repleta de aprendizados e desafios. Morando nos fundos da fazenda, experimentou a abundância familiar, onde sua mãe produzia alimentos e o pai garantia que nunca faltasse nada à mesa. Odete tomou consciência de sua identidade negra aos oito anos, quando, ao abrir a janela de seu quarto, viu suas mãos e pensou: "Eu sou diferente, sou preta." Esse momento revelador a fez perceber que, enquanto sua família era negra, seus vizinhos e patrões não compartilhavam da mesma cor. Essa reflexão trouxe à tona a noção de diferenças sociais e raciais, levando-a a entender o cuidado que seu pai tinha ao protegê-los de certos ambientes. Embora seus pais não falassem abertamente sobre racismo, suas atitudes mostravam preocupação, indicando que, embora não soubessem como enfrentar a discriminação, estavam sempre buscando formas de proteger seus filhos do preconceito.
Juventude e atuação comunitária
Na juventude, Odete se lançou em um caminho de militância e ativismo. Ao se mudar para a cidade, começou a trabalhar em um escritório de advocacia, onde também aprendeu sobre cidadania e direitos. Também começou a se envolver em pastorais socias e ações comunitárias. Ajudou a fundar a Associação de Moradores do bairro, atuando como presidente e organizando iniciativas voltadas para o empoderamento local. Ela fez o curso técnico de enfermagem, graduação em pedagogia, e especialização em Relações Étnicos Raciais. Odete também foi catequista e Ministra da Eucaristia, integrando a espiritualidade com a luta social. Nesse contexto, o encontro com a Irmã Olímpia foi muito importante, juntas trabalharam com mulheres marginalizadas, incluindo as empregadas domésticas que viviam situações de vulnerabilidade.
Esse trabalho comunitário a levou à Pastoral Afro, onde começou a articular ações voltadas para a valorização da cultura negra e a conscientização sobre o racismo. Com o apoio de Dom Oneres, ela participou ativamente das campanhas de fraternidade e se tornou uma voz respeitada em sua comunidade. Seu envolvimento com o Partido dos Trabalhadores (PT) também foi importante em sua trajetória. Odete se sentiu identificada com as propostas do partido, que refletem suas crenças e aspirações. Já foi candidata a vereadora e teve participação no diretório.
Odete compreende a importância das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) como espaços de transformação social. Ela assumiu a coordenação da Pastoral Afro do Regional Sul 4, e essa tarefa fortaleceu a Pastoral Afro da Diocese de Lages. Todo esse trabalho levou ao reconhecimento e homenagens. Em 2002, recebeu, da Assembleia Legislativa de Santa Catarina (ALESC), a Medalha Antonieta de Barros, pelos serviços prestados em defesa dos direitos da mulher. Em 2023, foi homenageada três vezes: em abril, pelas Mulheres Petistas do Estado; em junho, pelos 122 anos de nascimento de Antonieta de Barros na ALESC; em agosto, pela faculdade Estadual de Ponta Grossa, no Paraná.
Com sua trajetória marcada por um forte compromisso com a justiça social, Odete é hoje uma referência na luta pela igualdade e dignidade para todos. Símbolo de força, resiliência e luta por justiça social, sua trajetória transformou-se num ativismo vigoroso que impactou positivamente a comunidade e a diocese. Odete é uma voz poderosa na luta contra o racismo e em defesa dos direitos das mulheres e da população negra.
A JORNADA DE PADRE HENRIQUE NA DIOCESE DE LAGES
Padre Henrique é uma pessoa simples, que exala carisma e amor, muito acolhedor e de boas relações com todos ao seu redor. De espírito aventureiro, sempre gostou de viajar, acampar. Quando seminarista, subiu a Serra do Rio do Rastro de bicicleta para conhecer Lages. Gostou tanto que acabou voltando para ficar!
Nascido no município de Tubarão, cresceu em Pedras Grandes, sendo o caçula de quatro filhos, até que, aos 16 anos, ganhou mais um irmão. A vocação para o sacerdócio foi incentivada por sua mãe, que perguntava para ele se desejava seguir o caminho do sacerdócio. Ele despertou, encontrou um propósito maior e ingressou no seminário.
Em 1965, quando entrou no seminário com outros 119 jovens, não imaginava que seria o único daquela turma a se tornar padre. Em meio a um grande número de saídas e desistências, perseverou, seguindo para a faculdade de Filosofia e depois para a Teologia, onde ficou sozinho. Sua ordenação sacerdotal aconteceu em 8 de dezembro de 1979, em Tubarão. Após a formação, um acordo entre os bispos de Tubarão e Lages o trouxe para a nossa diocese quando foi enviado para trabalhar na Catedral.
A trajetória de Padre Henrique em Lages foi marcada pelo compromisso com a comunidade. Após um período de três anos na Catedral, assumiu a paróquia Nossa Senhora das Graças, onde conseguiu construir forte relação com a comunidade. Durante os oito anos que passou lá, implementou projetos importantes, como a criação de uma marcenaria comunitária e o fortalecimento dos grupos de famílias, movimentos populares e sindicais.
Sua atuação na Diocese não se limitou ao trabalho paroquial. Padre Henrique foi – e é - um importante líder na Cáritas, onde coordenou a criação de 16 Cáritas comunitárias juridicamente independentes, uma abordagem inovadora e única no Brasil. Ele acredita no empoderamento das pessoas e na importância da emancipação social. Suas ações não apenas transformaram comunidades, mas também criaram uma rede de apoio e solidariedade que continua a fazer a diferença até hoje. Ele foi reitor de um seminário que se diferenciava pelo modelo de trabalho e estudo em conjunto com a comunidade.
Henrique também exerceu a função de Coordenador Diocesano de Pastoral, ao mesmo tempo em que se dedicava ao acompanhamento da Cáritas e das pastorais em toda a região de Lages. Percorria milhares de quilômetros para dar suporte a grupos espalhados pela diocese, com o objetivo de promover a justiça social e o cuidado com os mais necessitados.
Atualmente, sua rotina envolve diversas atividades, desde as responsabilidades como pároco na Sagrada Família, sua atuação como diretor do ITEPAL (Instituto de Teologia para Leigos), Chanceler da Diocese, responsável pela coluna sobre Cidadania no Jornal Caminhada e ainda Coordenador Geral de Estágios na Facvest. Embora sua participação na faculdade não consuma muito tempo semanalmente, revisa documentos e assina papéis para estágios presenciais e à distância. Além disso, é frequentemente convocado para participar de aprovações de cursos quando o MEC visita a instituição. “Fora isso, acompanho aulas de teologia semanalmente e participo do cuidado pastoral da paróquia, atendendo especialmente os enfermos”.
Gosta muito da Chapecoense: “sou torcedor há muito tempo, inclusive antes do trágico acidente. Eventualmente, sou chamado para abençoar o estádio e as instalações, o que fiz recentemente após uma sequência de derrotas do time. Embora me chamem de conselheiro espiritual, prefiro ser reconhecido apenas como o padre que ama e acompanha a Chapecoense com suas orações”.
Na sua caminhada, Padre Henrique destaca que suas maiores alegrias vieram do trabalho junto às pessoas que mais precisavam. Ele sempre acreditou que o sacerdócio só fazia sentido quando se dedicava aos que sofrem. "Se teve alguma coisa que não foi boa, foi por mim mesmo", reflete ele, demonstrando humildade e sua entrega total à missão. O legado de Padre Henrique na Diocese de Lages é um testemunho de esperança, exemplo de vida dedicada ao próximo e à construção de um mundo mais justo e fraterno.
Adriana Palumbo Rodrigues
FREI ERVINO: Um homem de Paz... e de Bem!!
Frei Ervino Girardi, com 99 anos de idade, 77 anos de vida religiosa e 72 de presbitério, é a alegria e a tranquilidade em pessoa. Atualmente mora e trabalha no Convento São José do Patrocínio, mais conhecido como “Conventinho” em Lages, mas está em Lages há 32 anos. É um apaixonado por São Francisco e Santa Clara, e lembra da importância do cuidado com os animais, as plantas, a vida no planeta. Ele diz: “Deus nos dá tudo de graça, Ele é muito bom!”
Recebeu a mim e ao coordenador de Pastoral, padre Álvaro, poucos dias depois de voltar pra casa depois de uma internação hospitalar. Mas já estava bem: seus olhos vivos, azuis e brilhantes, a voz baixa mas firme, um sorriso no semblante. Caminhando apenas com o auxílio do andador, e vestindo um pala, Frei Ervino iniciou a entrevista falando da saúde, feliz por estar em casa, e agradecendo a Deus pela doença recente: “Foi o maior presente que Deus me deu” Por quê? “Aprendi um pouquinho mais, como Jesus sofreu e nunca reclamou, e está na Bíblia: Jesus sofreu em silêncio, e aquilo me ajudou muito, porque como padre, a gente corre muito, atende um doente, faz uma encomendação, atende pessoas; pensa muito em trabalho, trabalho, trabalho”, ele completa que a vida é muito mais que isso: precisamos da oração, nos aproximar ainda mais de Deus.
Um pouco de sua história
Frei Ervino nasceu em Santa Maria, no município de Benedito Novo (SC), no dia 9 de abril de 1925. Esta capela, como conta, pertencia na época à Paróquia de Rodeio e os frades davam assistência, entre eles Frei Bruno Linden, que está em processo de beatificação.
O exemplo e a religiosidade dos pais, influenciaram na sua vocação: “Meus pais eram muito católicos. Minha mãe era da Ordem Terceira Franciscana. Rezavam o terço em casa, e como rezavam. Tinha um quadrado, a gente se ajoelhava. Éramos em nove irmãos, cinco homens e quatro mulheres”.
Foi para o Seminário em Rio Negro em 1937, e vestiu o hábito franciscano em 14 de dezembro de 1946. Fez a profissão solene em 18 de dezembro de 1950. Foi ordenado presbítero em 1º de julho de 1953, em Petrópolis. Nesse tempo, quase não conseguia voltar pra casa para visitar os pais. “Aí, depois que fui ordenado, fui para casa em férias e para celebrar a primeira missa, no dia 5 de julho de 1953. Aí pude voltar para casa, tinha passado sete anos e meio sem pisar em casa”.
Frei Ervino trabalhou em Petrópolis (RJ); Duque de Caxias (RJ); em Rio Negro (SC); São Francisco do Sul (SC); Santo Amaro da Imperatriz (SC); Coronel Freitas (SC); e Lages, onde está desde fevereiro de 1992. Ele sorri e diz que se completar 50 anos em Lages pode ser chamado de lageano, mas ainda faltam 18 anos, está aqui há 32 anos. Quando pergunto o que mais marcou na Diocese de Lages, responde: “Tanta coisa bela. Olha, aqui no Convento me tratam como se fosse um verdadeiro filho, me tratam com amor e com carinho. Outro dia eu estava deitado e pensei: será que eu tomei o comprimido das 8 horas? em seguida o Frei Rafael entra no quarto com o remédio e o copo d´água... Como cuida de mim... E agora, depois da doença estou mais sossegado”, agradece.
Ele levanta às 4h30 da manhã, se arruma, faz suas orações e às 6h vai para a capela, porque tem o seu encontro com Jesus. Às 7h os outros freis que residem no convento chegam para iniciarem o breviário e o terço. “Depois vamos tomar café, depois a gente se prepara para as 9h começar o expediente. Pergunto se ele atende confissões também, e ele responde: “Sim, antes da última doença, eu cuidava das confissões à tarde. O meu quarto fica bem pertinho do lugar onde atendemos confissões, e eu tenho essa vantagem que eu posso andar, porque não posso ficar sempre sentado, não estou ainda bem bom das pernas, mas olha, estou felicíssimo. Quero dizer uma coisa: quando eu dirigia carro, a polícia nunca me pegou passando dos 80; São Pedro me deixou passar dos 90, chegar aos 99. Será que São Pedro vai me deixar passar dos 100?” Eu e padre Álvaro respondemos: “Vai, sim!”
Padre Álvaro pede ao frei que deixe uma mensagem para quem está começando agora, pensando em ser padre, pensando em entrar no seminário, no convento, na vida religiosa: “Aproveite, porque Deus te chamou e te escolheu. Tenha confiança, vale a pena, gente, vale a pena, vale a pena, estou felicíssimo!! Deus é bom!”
Adriana Palumbo
DONA ALICE – PIONEIRA DA RENOVAÇÃO CARISMÁTICA EM SANTA CATARINA
“O que essa mulher e seu marido Osvaldo fizeram pela diocese de Lages nunca ninguém fez. Eles são joias preciosas para a nossa diocese”. (Dom Oneris Marchiori)
O Jornal Caminhada deste mês traz o testemunho de Alice da Silva Carvalho, pioneira da RCC em Santa Catarina. Junto com seu esposo, Osvaldo Carvalho (in memoriam), dona Alice andou pela Diocese de Lages e por todo o estado pregando a Palavra, rezando e louvando a Deus. Hoje, mesmo com idade avançada, tem uma vida bastante ativa e firme na caminhada. Recebeu a mim e ao Coordenador Diocesano de Pastoral, Padre Álvaro, em sua casa, para uma conversa agradável, com recordações e muita esperança.
Aos 94 anos, caminha com agilidade pela casa, participa semanalmente de Grupos de Oração e ainda cuida dos próprios negócios. “Estou construindo uma casa aqui atrás pro meu neto morar comigo. Porque as netas foram tudo embora. E a filha, mais tarde, claro que vai morar com as filhas. Daí eu fico com o neto”, ela diz sorrindo. Relata que nesse local faz suas leituras diárias; para isso, são providenciadas cópias ampliadas de publicações religiosas, usa óculos e uma lupa.
Ela mostra o livro “Dona Alice – uma vida dedicada à Renovação Carismática de Santa Catarina”, escrito por Antônio Marcos da Cunha. Ali, encontramos várias passagens de sua trajetória, que vai confirmando na conversa.
Um pouco de sua história
Nasceu no dia 15 de outubro de 1929 em Rio do Oeste. Seus pais sempre foram católicos fervorosos, as crianças cresceram na fé. Aos 15 anos, conheceu o grande amor de sua vida, o sr Osvaldo. Após três anos de namoro e um de noivado, casaram-se na igreja matriz de Rio do Sul.
Em 1948, mudaram-se para Ponte Alta, em 1949 nasceu o primeiro filho, Waldir, que faleceu com 4 meses de vida. “Dois anos depois Deus nos presenteou com uma linda menina, a qual demos o nome de Maria Waltair”. Quando Waltair completou 12 anos, a família decidiu mudar para Lages, para que a filha pudesse estudar e se formar.
Em Lages, dona Alice participava do Apostolado da Oração, na Catedral Diocesana, e em 1977, participaram do Cursilho, na Casa de Formação. Essa experiência despertou o casal para a liderança, o ensinamento e entendimento sobre a vida comunitária. Foi o Frei Felipe Gabriel Alves, conhecido como Frei Filipinho que fez o convite para a Renovação Carismática Católica (RCC). Dona Alice a princípio não valorizou muito, mas o marido aceitou prontamente o convite. Ela afirma, em seu livro: “Participei de vários eventos da RCC junto com o Osvaldo e o Frei Filipinho, mas ainda não tinha tido um encontro pessoal com Jesus”.
Esse encontro aconteceu em 1979, num Congresso da Renovação em Belo Horizonte – MG. Ela e o marido, Sr Osvaldo de Carvalho, foram convidados pelo Frei Filipinho para ir ao Congresso Nacional da RCC. “Daí o Osvaldo já se assanhou pra ir... Eu disse: eu vou, mas vou para ficar no hotel. Separei a minha roupa da dele. Vou ficar num hotel e você vai nesse encontro com o frei”. Mas quando chegaram lá, numa chácara das irmãs, veio um casal sorridente recebê-los, e insistiu, que o quarto do casal já estava pronto. Ela ficou... “Sexta-feira eu não senti nada perigoso. Sábado também não. Quando foi domingo de manhã, daí sim. Era seis e meia da manhã, e o padre disse: Todos na sala de oração, na capela. E aí o sol estava nascendo. Aqueles raios de sol entrando, e brilhando naquele cibório. De repente, me deu uma coisa tão boa! Eu vi a mão de Jesus vindo na minha direção. Daquela hora em diante, minha vida deu um salto de novecentos por hora. Nunca mais fui a mesma pessoa!”
“Depois desse dia, nunca mais paramos... A gente começou na Diocese, mas já foi para o Estado, porque no Estado, eles queriam, e nos chamavam. Ela destaca o apoio recebido do Frei Filipinho e também do então padre Orlando Brandes (Hoje, Dom Orlando, arcebispo de Aparecida). Em seu livro, está escrito: “Todo final de semana, Osvaldo e eu estávamos em alguma cidade, com uma equipe para evangelizar e proclamar as maravilhas de Deus: experiências de oração, aprofundamento de dons e carismas, formação sobre os frutos do Espírito Santo e Seminário de Vida no Espírito Santo. Sentia fortemente a presença de Deus em cada missão que realizávamos” (CUNHA, 2019).
“Então foi assim a nossa luta”, ela diz, com simplicidade. Dona Alice foi, por muito tempo, coordenadora da RCC em Santa Catarina, e nesse período fez muitas viagens, não só no estado, mas também pelo Brasil e até ao exterior. Mesmo com medo de embarcar em avião, ela disse sim, e foi participar do Congresso Internacional da RCC em Roma. Participou de um encontro com o Papa João Paulo II, que contou com a presença de aproximadamente mil líderes carismáticos de cem países.
Dona Alice fala manso, baixinho, mas tem muita firmeza no olhar, nos passos e no que faz. Ela frequenta um Grupo de Orações na Catedral e outro na Igreja do Navio. “Ainda atendo pessoas, faço aconselhamentos e orações, junto casais que estão quase se divorciando”. Faz a distribuição de cestas básicas a 20 famílias mensalmente. “E minha vida segue assim”.
Adriana Palumbo
Sidnez e Neide Furlan
A LUTA PRA NÓS É UM PRAZER: VIVEMOS ASSIM PORQUE GOSTAMOS
Um casal que ajudou a criar e dar nome ao Jornal Caminhada, atuando firme nas atividades diocesanas há 40 anos. Por muitos anos, participaram da Comissão Pastoral da Terra (CPT), CEBs e no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Curitibanos. Ainda hoje mantém essa lida e testemunho de vida e esperança. Sidnez tem 69, e Neide 68 anos, fazem de suas vidas o testemunho da esperança, em buscar do bem viver, harmonia com a terra e em defesa da vida.
CAMINHO PERCORRIDO
Neide nasceu no Rio Grande, e como os pais eram agricultores em Campos Novos, foi registrada em Campos Novos. Quando ainda era criança, foram morar em Caçador, e depois em Curitibanos. “Mesmo com o pai indo trabalhar em outro lugar, nós fazíamos roça: a gente plantava milho, feijão, moranga, abóbora, tínhamos vaca de leite e criávamos galinhas”. Aprendeu desde pequena a usar os estercos das galinhas e do gado para colocar na terra. “Nós tínhamos uma horta bonita, com muitas verduras. Meu irmão saía pra vender as verduras e os ovos na vizinhança, pra ajudar o pai e a mãe a nos criar”. Neide relata a forma como foi criada, muito católica, sempre participando e ajudando na comunidade. “A gente não se levantava sem eagradecer e nem ia se deitar. A mãe era da Legião de Maria, e sempre rezávamos a Salve Rainha em italiano com o pai. São coisas que a gente não esquece”.
Sidnez nasceu em Orleans, “mas tive o privilégio de me criar em Taquaruçu, onde nasceu a Guerra do Contestado. Então, em função dessa história, ainda adolescente comecei a participar de reuniões e seminários. Ouvia muito sobre o sindicato – uma ferramenta de luta para o agricultor”. Sidnez entrou para o sindicato, e também começou a participar de alguns encontros ligados à Igreja e à Comissão Pastoral da Terra.
“Nessa caminhada nós conseguimos fazer com que a 1ª Romaria da Terra, em 1986, fosse lá em Taquaruçu, por que tinha uma ligação com a história e São João Maria, dia da Santa Cruz, e todo esse simbolismo”. Nesse tempo, também ajudaram a criar o Conselho do Movimento dos Atingidos pelas Barragens e vários sindicatos. "Desde aquele tempo, a nossa busca era a Justiça Social”, afirma.
Para ele, hoje existe um conflito de entendimento. “Nós temos que observar que a nossa ignorância é tão grande que chegamos ao ponto de colocar veneno na comida das pessoas que a gente ama. E leitura é a forma que nós temos de prevenir esses perigos. Nós já distribuímos, só na nossa região, mais de 6 mil livros, de sociologia, história, plantas e ervas medicinais”.
O casal se conheceu em razão do estudo de história. Sidnez trabalhava no sindicato, e Neide procurou saber mais sobre esse assunto. Ele vinha do sítio e parava na loja onde ela trabalhava para conversarem. Daí, foi um passo, e no ano de 1982 se casaram. Quando tiveram a primeira filha, realizaram o batizado dentro do sindicato, tendo o pe. Geraldo Locks e a irmã Jandira Bettoni como padrinhos, e o pe. Dilmar Sell como celebrante. Eles tem três filhos, mas dizem que são quatro, pois ajudaram a criar o neto, porque a filha mais velha estudava. “E temos os outros filhos, das pessoas do movimento, que nós ajudamos a criar também, por um certo tempo.”
Sidnez sempre incentivou a participação e militância da esposa nas pastorais e no movimento sindical. Neide participava em Curitibanos, começou a viajar pela região, para Chapecó e até Brasília. “Foi assim, fui estudando a questão dos movimentos sociais, a valorização da mulher, a CPT e a Igreja. Nessa questão da agricultura, uma coisa que eu sempre amei e continuo amando são as sementes. A gente tem a mania de colocar as sementes no bolso e depois ir partilhando”. Além das sementes, tem as plantas medicinais, a bioenergia, que ela já fez vários cursos. Com a pastoral da saúde, faz uso e ensina a fazer tinturas e pomadas. Neide é uma das guardiãs de sementes da região. Foi homenageada em Brasília, inclusive pelos índios.
A harmonia e cuidado com a terra, uso de chás, e remédios naturais como tinturas e pomadas, são temas que eles trazem em três programas nas rádios locais.
O casal trabalha em família, de forma articulada, e também tem atuação política: pelo trabalho deles junto à natureza, ajudando pessoas, com a CPT e o sindicato, Sidnez foi vereador por dois mandatos, várias vezes presidente do sindicato rural e até juiz classista. Neide já assumiu a vereança por um tempo, Secretária de Agricultura e hoje é presidente do Sindicato dos Trabalhadores Ruuais. O filho, Sidneyzinho, também foi vereador por dois mandatos.
Na casa deles, a mesa está sempre posta, sempre tem muitas frutas, eles trazem bastante coisa do sítio, porque sempre está chegando gente na casa deles, e “as pessoas levam”. Eles distribuem sementes, livros, frutas. “Nós vivemos assim porque gostamos, é um prazer pra nós dois, comungamos da mesma ideia, isso é muito importante”.
Texto e fotos: Adriana Palumbo
Homenagem Diocese de Lages - Eroni
UMA VIDA DEDICADA PARA A SOLIDARIEDADE
Existe uma música que diz “Pra consertar esse planeta é preciso ter boa vontade e senso de humanidade”, essa canção, de autoria desconhecida, pode ser a trilha musical da vida de José Eroni Medeiros, o personagem do TESTEMUNHO DE ESPERANÇA da edição deste mês.
Seu Eroni, como é conhecido na Diocese, representa o testemunho em vida da solidariedade e doação em prol da construção de uma nova sociedade. Liderança da Paróquia Nossa Senhora da Saúde, no bairro Guarujá em Lages, ele é referência em toda região serrana na luta em defesa das crianças e adolescentes. Integrante de diversas pastorais, Eroni foi conselheiro tutelar e assessor da Cáritas Diocesana de Lages, doou parte de sua vida em prol do evangelho e do testemunho de fé.
Nascido e criado na comunidade de Rio dos Touros em Urupema, a história da família de Eroni segue tantas histórias de famílias de trabalhadores rurais da serra catarinense. Expulsos de suas terras por não possuírem documentos, Eroni e seus 10 irmãos, testemunharam em vida as dificuldades dos agricultores.
“Fizemos muitas roças, derrubamos matas virgens, lavramos terras, arrancamos caule da arvores para o plantio de alfafa e por aí afora. Foram anos que trabalhamos nessas condições e nesse tempo conseguimos fazer com que o proprietário da terra ficasse mais rico, aumentasse suas fazendas, enquanto a nossa família ficou mais empobrecida, pois saímos daquela situação em 1974”, conta Eroni o ano em que a família sai do interior e vem para Lages.
O pequeno agricultor, sem terra e meeireiro, agora com 18 anos de idade, deixou essa condição e passou a ser um morador urbano e operário, quando a madeira estava em ascensão na região. Sua família foi morar no bairro Tributo, depois Pisani e Vila Esperança, onde reside até hoje.
Foi na cidade que passou a participar nas pastorais da igreja atuando na liturgia na Capela São João Batista do bairro Tributo e depois se tornando catequista. “Meus pais sempre foram católicos praticantes, desde pequeno aprendi na família a importância da participação na vida religiosa, aprendi com o exemplo dos meus pais que um dos valores da vida era a participação na comunidade”, relembra Eroni.
A atuação dele também foi marcante na criação de Grupos de Jovens na paróquia, nos grupos de família, no Conselho Comunitário e como Ministro da Palavra, de Batismo e até como Ministro Extraordinário como testemunho qualificado do Sacramento Matrimônio, em que chegou a realizar dois casamentos e dezenas de batizados.
Mas o testemunho de fé de Eroni sempre foi pautado na Teologia da Libertação, para ele não tem evangelho que não seja instrumento para transformação da sociedade e busca do fim da desigualdade social. Nesta caminhada, adquirida com muito estudo teológico oferecido pela Diocese, Eroni fez sua trajetória pautado na busca de direitos aos mais vulneráveis. Se colocou na vida política, foi perseguido e ficou desempregado quando seus filhos, Sílvia e Helder, ainda eram crianças pequenas.
“Em 1989 fui demitido da madeireira que trabalhei por 16 anos, deixei de ser operário. Fui demitido pois eu havia se tornado um perigo para a empresa, já que o meu diálogo com os colegas de trabalho falava dos direitos dos trabalhadores, pois eu era membro e havia participado de duas oposição sindical, e ainda estava na Pastoral Operária, sem falar que em 1988 havia sido candidato a vereador pelo Partido dos Trabalhadores”, relembra Eroni. Marcado e rotulado pelas empresas, ele e sua família foram acolhidos pelos companheiros da igreja que, durante meses, foram os que mantiveram o alimento na mesa da sua casa.
Nenhuma destas caminhadas ele faz sozinho, tem ao seu lado uma companheira de vida inigualável e combativa na comunidade, Ladi Oliveira Medeiros, ou a Nega como é conhecida, sempre foi e continua sendo sua parceira. Ela que atuou durante anos nas Pastorais Sociais, da Saúde e da Criança, se revezava com o cuidado com os filhos para que Eroni pudesse se dedicar para vida da comunidade.
Já como profissão Eroni foi conselheiro tutelar durante 3 mandatos nos anos de 1998 a 2006 e depois de 2016 até 2018 quando precisou se afastar para cuidar da saúde. Referência estadual no debate de defesa dos direitos das crianças e adolescentes, chegou a ser premiado na Assembleia Legislativa com a honraria “Amigo da Criança”.
Agente voluntário da Cáritas Diocesana desde 1995 até 2005 quando foi incluído na equipe executiva da entidade. Trabalhando mais de 10 anos na entidade, Eroni ajudou em projetos de distribuição de alimentos para famílias vulneráveis e em cursos de capacitação de conselheiros tutelares em cidades da região.
Foi nesta entidade que recentemente Eroni foi homenageado. Referenciado como testemunho de sua fé e dedicação ele, acompanhado de sua esposa, recebeu uma placa em agradecimento aos serviços prestados.
Acometido de uma doença hereditária e sem cura, Eroni tem se mantido forte mas precisou se afastar de todos os trabalhos para se dedicar aos cuidados com sua saúde. Apesar de ter muita dificuldade na fala, Eroni celebra com o sorriso a gratidão pelo reconhecimento da sua vida doada para a transformação da sociedade e para testemunho do evangelho.
Obs: a matéria foi escrita por sua filha que é jornalista, Silvia Medeiros, e com recortes de um depoimento de Eroni escrito sobre a sua história, antes do avançar da doença.
SE DEUS NÃO ESTIVESSE COM A GENTE, NÃO TERIA FÔLEGO PARA TANTAS COISAS
Neste mês, o Jornal Caminhada relata um pouco da história da Irmã Elice Lúcia Mattana, da Congregação Missionárias de Jesus Crucificado. Em agosto, completa 49 anos de serviço e estemunho na Diocese de Lages. Ela nos recebeu no Centro Social Santo Antônio, bairro Morro Grande, onde desempenha seu trabalho.
Irmã Elice mora sozinha, e com 87 anos, tem uma rotina bastante puxada: “Eu levanto às 4h da manhã, esse é sagrado: minhas orações até 5h30, daí faço e tomo o meu café, abro a casa e venho para o Centro Social às 7 horas”. Afirma que gosta de chegar cedo para não se atrapalhar pelo movimento da escola próxima à sua casa. “É carro, é gente, é aluno, é cachorro, é tudo que passa lá. Na ida e na volta, prefiro passar perto da escola fora do horário de entrada e saída”. Vai almoçar em casa, mas às 13h30 está abrindo o Centro Social novamente. “Aqui toda a tarde tem coisa”.
O Centro Social Santo Antônio oferece aulas de pintura em tecido, reciclagem com caixinhas de leite, costura, artesanato, biscuí, manicure e pedicure, violão, teclado, gaita e banda. A maioria das pessoas que participam dos cursos, são dos bairros São Luís, Centenário e proximidades. Quando irmã Elice recebe alimentos do Programa Mesa Brasil, ou do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) via Cáritas Diocesana, ela distribui para as famílias mais necessitadas que frequentam os cursos ou que são cadastradas no Centro Social. Atualmente, são 90 alunos frequentando estes cursos, e 200 famílias cadastradas.
No Centro Social, há uma sala especial, com maquinários específicos para a preparação da MULTIVIDA, que também é conhecida por Multimistura da Pastoral da Criança. Há mais de 15 anos, a Pastoral da Criança vem orientando as famílias para o uso de Alimentação Enriquecida, para combater a desnutrição. A MULTIVIDA é um composto com farelo de trigo, farinha integral, germe de trigo, aveia, linhaça, konaco de soja, farinha de mandioca e farinha de milho. Quando a irmã Elice faz a MULTIVIDA, tem que ser no sábado, porque leva bastante tempo.
Eu pergunto: “E aí, quando a senhora sai daqui, volta pra casa, lá pelas 5h ou 6h da tarde?” Ela responde: “Não... às 16h30 fecho o Centro Social, daí vou fazer visitas... Tem uma doente aqui que não levanta da cama há anos, tem um outro que trabalhou muito alí na Paróquia, e também uma outra senhora, lá em cima. Enfim, faço umas visitinhas, ou vou ao centro pagar contas... telefone, internet, água, luz”.
O coordenador de Pastoral, padre Álvaro Emanoel, que está me acompanhando na entrevista, comenta que ela cuida sozinha do Centro Social Santo Antônio, organiza tudo, limpa, monta, desmonta. Eu pergunto: “A senhora não fica se sentindo cansada?” ela responde com voz firme: “Não senhora”
Infância e o despertar da vocação
Ir Elice nasceu em Sertão- RS, no dia 2 de dezembro de 1936. De descendência italiana, era a segunda de seis irmãos. Desde pequena, ajudava em tudo na Capela de sua comunidade, mas tinha medo do padre, que era muito bravo...
Despertou para a vida religiosa em Passo Fundo. “Fui participar de um retiro, a Capela pagou minha viagem e o retiro em Passo Fundo. O padre falou sobre todas as vocações - casada, solteira e vida religiosa. Naquele dia, fiquei pensando, não consegui descer para ir almoçar...fiquei pensando, pensando.” Chegando em casa, conversou com a mãe e o pai, dizendo que queria ir...A mãe disse: não, você não vai... o pai pegou o cavalo, o trem, e foi a Passo Fundo falar com a madre.
A madre disse que ela poderia fazer uma experiência no final do ano, na Casa de Retiros, pra ficar ajudando. E assim foi: “o pai me levou a Passo Fundo, chegando perto da casa tomamos uma guaraná, ele saiu chorando e eu fiquei”. Ela ficou um tempo na Casa de Retiros, e logo a irmã geral já disse: “A Elice é muito rápida, faz tudo”. E Ela entrou na Congregação Missionárias de Jesus Crucificado em 20 de abril de 1960, na abertura do 1º sacrário da Congregação. E no segundo ano, ficou na casa regional ajudando. “E a madre de lá dizia, Elice vai limpar o pátio,
cortar grama, plantar não sei o que, daí a gente ia. Quando ela chamava, tinha um sino, dava cinco badaladas: a quinta era a minha, as cinco chagas do Nosso Senhor Jesus Cristo... e realmente eu era rápida: de onde eu estava, ia atender”.
Irmã Elice trabalhou em Passo Fundo, Porto Alegre, Viamão, Florianópolis, Curitiba e participou de missões em Uruguaiana. Fez os votos perpétuos em 1974; em 1975 seu pai faleceu, o que a deixou muito abalada - demorou uns seis meses pra se recuperar - e no mês de agosto veio residir em Lages. Morava perto da livraria Diocesana com mais três irmãs. Logo que chegou, começou a auxiliar no Centro Social Santo Antônio e no Clube de Mães do Morro do Posto. Trabalhou bastante tempo com a comunidade, após uns 10 anos, foi fazer um curso da
Pastoral da Criança em Florianópolis e em seguida iniciou a implantação dessa Pastoral na Diocese de Lages. “Começamos a pesagem com quatro líderes, e depois foi se espalhando... chegamos em 23 paróquias da diocese”, explica.
Indagada sobre o que mais gosta de fazer, responde: “O que estou fazendo, tudo isso aí... Fazer aquilo que eu posso fazer e faço com muito amor”. Sobre sua vida religiosa, afirma: “Eu quero continuar a missão; corresponder também a questão da obediência e o carisma da Congregação, que é ir ao encontro dos mais necessitados. Se Deus não estivesse com a gente, não teria fôlego para tantas coisas...” Ela tem razão, não teria mesmo.
Texto e fotos: Adriana Palumbo
TESTEMUNHOS DA ESPERANÇA
A partir deste mês, fazendo parte das ações preparatórias ao Jubileu, o Jornal Caminhada vai trazer a história – testemunho de uma pessoa da nossa Diocese. Estamos iniciando com a história do padre Arduino Salami, 96 anos, vigário na Paróquia São Francisco de Paula, no município de Cerro Negro.
“SE FOSSE PARA EU COMEÇAR TUDO DE NOVO, EU RECOMEÇAVA” (Arduino Salame)
“Padre Salami está sempre sorrindo, de bem com a vida, ele é muito bom de lida” – com essas palavras, o pároco, padre Lindomar Borges, recebeu a mim e ao coordenador de Pastoral da Diocese, padre Álvaro Emanoel da Silva, quando fomos ao Cerro Negro para fazer esta matéria. Lindomar contou que Padre Salami levanta cedo, toma um remédio em jejum, e depois o café com leite e torradinhas; “Depois do café, ele toma os remédios de pressão, e geralmente vai para a Igreja, fazer sua oração; em seguida, quando está animadinho, vai fazer a limpeza no pátio, no jardim, na frente e atrás da casa. Tem uma enxada que está bem gasta, mas ele pede para um integrante do Conselho afiá-la. É a terapia dele, faz bem para a saúde. Inclusive lá atrás da casa fizeram um jardim, ele lidava muito ali. Agora ultimamente, que está um pouco mais debilitado e não tem ido, recomendaram para não se esforçar tanto, por causa do sol e calor. Mas ele fica bem à vontade”. Padre Salami gosta muito de ler e escrever: 13 edições de livros publicados: “Minha vida, minha história”.
Os padres Lindomar e Salami moram juntos há 17 anos (8 anos no Cerrito e 9 anos em Cerro Negro), e à noite, costumam assistir ao Jornal Nacional. Nas quartas-feiras assistem o futebol, que gostam bastante. Padre Salami fala carinhosamente do Lindomar: “ele cuida de mim como um pai”.
Infância e vocação
Padre Salami nasceu em Tapera, no Rio Grande do Sul, em 1927, e cresceu ao lado de seus pais e 11 irmãos. “Fui aluno das irmãs Filhas do Sagrado Coração de Jesus, com educação muito profunda, e o amor ao Coração de Jesus. Eu era coroinha, o padre tinha dois metros de altura, dava medo...”.
Com 11 anos, Pe. Salami foi pela primeira vez para o seminário, dos Redentoristas, mas incomodado com o latim, acabou desistindo, e voltando para casa. Os pais estranharam, mas aceitaram. Depois de 2 anos, a família recebeu a visita de um irmão da Congregação Lassalista, e desta vez, ele seu irmão Izidoro aceitaram o convite, e foram para o seminário em Canoas – RS. Em 1945, aos 18 anos, tornou-se irmão, e passou a ser chamado irmão Miguel Lourenço.
Em 1948, embarcou para Roma (Itália), para trabalhar na Casa Geral da Congregação Lassalista. “Ficamos 13 anos na Itália, à serviço, acolhendo e atendendo as pessoas”. Nesse período ele conheceu pessoalmente três papas: Pio XII, João XXIII e o papa Paulo VI. “Lá eu conheci Dom Oneres Marchiori, que era seminarista, e estudava no Pio Brasileiro, que era pertinho da Casa
Lassalista. Nós jogávamos bola juntos, contra os times de seminaristas, nós sempre ganhávamos...”
Quando voltou para o Brasil, em 1961, foi trabalhar em Flores da Cunha e depois em Carazinho, onde fez o Curso de Contabilidade. Quando se formou, sentiu que era a hora de seguir o sonho de ser padre; então, procurou Dom Oneres (na época era coordenador de pastoral) e perguntou se o aceitariam na Diocese de Lages como aspirante ao presbiterato. Dom Oneres falou com Dom Honorato, e então Arduino Salami veio para a Diocese de Lages, estudar Teologia no Instituto Teológico de Santa catarina (ITESC), integrando a primeira turma em Florianópolis.
A ordenação presbiteral ocorreu em 7 de dezembro de 1975, em Rondinha, no Rio Grande do Sul. “Minha primeira paróquia foi em São José do Cerrito, em seguida trabalhei em Campo Belo, São Cristóvão do Sul, Painel e Cerrito de novo. Depois vim para Cerro Negro, onde estou há 9 anos” finaliza, sorrindo.
O que mais chamou sua atenção na Diocese de Lages foram as figuras do Dom Honorato e do Dom Oneres, e a acolhida do povo, da comunidade. “Foi uma caminhada, um desafio. Em cada paróquia, uma realidade. Calcule: a gente não merecia tantas coisas de Deus, mas Deus foi um Pai...
Eu não sei como agradecer a Deus, gente; Eu sempre digo assim: que que eu fiz para merecer tudo isso? Nada!”
Ao final da conversa, foi indagado pelo coordenador de Pastoral, padre Álvaro: “O que o senhor diria para alguém que está pensando em ser padre e esteja em dúvida?”. Padre Salami riu, e respondeu: “Eu diria: meu filho, vale a pena! Diga sim, e vai! você será feliz! Se fosse pra começar tudo de novo, eu recomeçava!!”
Adriana Palumbo