Diocese de Lages

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CÍRCULOS DE PAZ E SINODALIDADE: UM CAMINHO DE AMOR

“Diadorin deixou de ser nome e virou sentimento meu…Diadorin é minha neblina… Amor é a gente querendo achar o que é da gente”. (Guimarães Rosa)

Foram nebulosos os dias 09 e 10 de setembro de 2024 na Ilha da Magia. A fumaça das queimadas criminosas, do Grande Sertão, Veredas e de todos os biomas brasileiros, juntaram-se à neblina que cobria o amanhecer e o pôr do sol na ilha de Santa Catarina, assim como os gritos de pavor das árvores, plantas e animais que buscavam consolo e cura junto às bruxas e benzedeiras de Franklin Cascaes na baía do Itaguaçu.

Restaurar as vidas ameaçadas no limiar de mais uma primavera que insiste em re-existir no sul do mundo, tornou-se imperativo para um grupo de human@s sonhador@s, provenientes de diversas regiões do país, para escutar Kay Pranis e se encantar com sua capacidade de nos ouvir.

Assim, estávamos reunid@s por dois dias no auditório do TCE/SC, desejos@s de vivenciar Círculos de Diálogo e Construção de Paz e compartilhar novas práticas de Justiça Restaurativa (JR).

Todas as palavras que procuro para escrever esse texto, serão insuficientes para expressar tudo o que vi e ouvi, senti e vivi nesses dias. Tantos gestos e abraços, sorrisos e gentilezas, extrapolam minhas poucas palavras, mas têm a potência de saciar minhas sedes como fontes generosas no meio de caminhos áridos e sombrios.

Conectad@s em uma primeira vivência de Círculo de Diálogo, encontramo-nos para vencer o anonimato e a introversão do primeiro dia. Éramos oito, número sagrado e potente, significando um novo começo desde os tempos mais remotos de nossa ancestralidade. A partir dos nossos nomes, fomos dizendo de nossas andanças, sentimentos, projetos, angústias e esperanças. Daniela falou-nos das lutas e Vitórias de amor com sua filha. Letícia era a própria alegria nos olhos brilhantes e solidários com a companheira de universidade. Marcelo contou do desafio em construir diálogo com todas as bio-socio-diversidades de seu ambiente de trabalho. Liz nos fez sentir con-vocad@s pelos princípios fundamentais da JR. Samuel transbordava entusiasmo na proposição de objetos de fala improváveis em círculos de paz sem fronteiras. Isabela nos encantou com seu engajamento com as políticas públicas de seu município. Sílvia compartilhou a alegria de acompanhar a pesquisa dos estudantes de direito em práticas restaurativas. E eu, andarilho da esperança, ousando carregar cada um/uma no meu coração como “diadorins” e todo o sentimento do mundo.

Sentados no chão, em cumplicidade restaurativa, juntamos nossas mãos e nos permitimos conectar com todo o universo. A partir dessa vivência, para mim, o auditório do TCE passou a ser também escutatório, onde a voz e a presença de cada um/uma era única, genuína e digna de reverência. Ouvindo a sabedoria dos cabelos brancos daquela mulher de 76 anos, foi esse meu maior aprendizado: há tempo para falar e há tempo para escutar. Há tempo para calar e escutar sempre de novo. No diálogo, podemos até prescindir das palavras, pois a gramática do coração e da paz supera todas as fronteiras dos códigos de linguagem.

Por fim, improvisamos um círculo rompendo os obstáculos das poltronas e do grande número de pessoas. Balbuciamos com Maria Bethânia o sonho de “voar num limite improvável… e ver uma flor brotar do impossível chão”. Leoberto nos convidou a elevar os corações ao alto e revelou seu desejo de rezar, invocando outra Maria, de Aparecida: “ilumina a mina escura e funda, o trem da minha vida”. Entre abraços já saudosos e lágrimas contidas, seguiremos em travessia, circulando nesse mundo fumaceado e hostil com aqueles/as que insistem em semear a paz. Não estaremos mais sós. A solidão deu lugar a solidariedade. Somos muit@s e caminhamos junt@s. A Sinodalidade está tatuada em nós.

Quanto a mim, retorno para Bocaina do Sul, na serra catarinense, confirmado pelo mantra que nossas comunidades gostam de cantar: “Para mudar o mundo, o amor de todo mundo. O amor de todo mundo, para mudar o mundo”. E com o coração agradecido porque só o amor é capaz de anunciar um novo amanhecer de primavera às nuvens provocadas pela crueldade humana:

   “Por ser inexato, o amor não cabe em si. Por ser encantado, o amor revela- se. Por ser amor, invade e fim”. (Djavan)

PRIMAVEREMOS! É POSSIVEL!

pe. Roberto Moreira  Bocaina do Sul, 11/set/2024

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